Solidão é, para muitos, um terrível fantasma. Temida, mas inevitável num ou noutro momento, torna-se, não raro, a companheira da velhice. Mas na verdade está presente a vida inteira, desde a infância.
PARA SEMPRE SOZINHOS
Isto porque existe uma solidão inerente à existência. Ser só é a condição primordial para ser um indivíduo, considerando-se que nunca alguém sentirá da mesma forma, com o mesmo sentir, a mesma intensidade, o mesmo colorido, o que outra pessoa está sentindo. Quando eu sinto, muitas vezes penso; e o meu pensar, para chegar até outrem, tem que se revestir de um código, seja uma palavra ou gesto. Entre o eu e o outro já existe, notoriamente, uma distância a ser percorrida pelo símbolo ou sinalização. E, já não bastasse isso, há que passar ainda o pensamento original pela barreira da interpretação. O que eu digo deve ainda ser interpretado pelo outro. E cada interpretação deriva de uma experiência própria, única, intransferível.
Daí estarmos sempre sozinhos. Porém não significa que devemos estar solitários.
SOZINHO X SOLITÁRIO
Há uma sutil diferença entre sentir-se sozinho e estar solitário. Ser só, como dissemos, é humano. Solitário, não. Sentimos necessidade de acompanhar uns aos outros, pois somos instintivamente seres gregários. Nossa natureza nos obriga a precisar de companheiros.
Que faz um homem solitário? Que poderá construir, realizar, edificar, sem o concurso de algum parceiro? Que teria sido da raça humana, não fossem os primatas se reunindo em bandos, em grupos de caçadores e agricultores?
Tolo aquele que pensa poder prescindir dos demais. A vida ensinará que não pode estar à parte.
Alguns dizem ser como peixes fora do aquário, reclamam não encontrar com quem compartilhar as idéias. Isolam-se enquanto lamentam a própria inadequação, mas na verdade estão ilhados no orgulho. Com que ar de superioridade não dizem que os demais pensam diferente, em comentários de disfarçada humildade, quando queriam dizer que os outros pensam pobremente, que não lhes estão à altura!…
PARA EVITAR A SOLIDÃO
Mas a vida ensina. Chega o dia em que somos todos iguais, irremediavelmente: o dia da doença, da aproximação da morte, do medo, da carência afetiva, como foi o dia em que nascemos. Quando se precisa de um colo, pouco importa o quanto se pode conversar, trocar idéias. Colo é colo, e um sábio pode se comprazer no colo de um ignorante, se ali sentir-se verdadeiramente amado. Assim, o bebê, que desconhece ainda a força do verbo, vive como ninguém a experiência de ser uno com o outro.
Ser uno com o outro é não julgar, nada esperar, simplesmente estar presente. É o momento em que a distância que nos separa da outra pessoa reduz-se ao máximo, e nos damos conta de que, embora sejamos sempre únicos, não estamos à parte.
Para evitar a solidão, é preciso aprender a ver o que está além dos olhos. Ver dentro do outro. Ser empático. Quando o outro parecer tão diferente a ponto de nos calar devido a impossibilidade de fazer um contato pela linguagem, é preciso primar o contato com o potencial do outro. Como disse Terêncio*: “Sou humano, e nada humano é estranho”. Em algum aspecto, já que somos todos humanos, nos encontramos, e o desafio está em nos permitirmos este encontro.
Às vezes ficamos acomodados na perspectiva de que alguém nos arranque da solidão. Que alguém preencha nosso vazio interior. Mas esta é uma tarefa para nós mesmos. Como esperar que o outro venha se não o convidamos? Se quando ele vem, o submetemos a um teste de seleção? E nosso interior vazio não está assim pela falta de outra pessoa, mas pela falta de nós mesmos. Quando vivemos uma vida alheia a nós mesmos, quando esquecemos quem realmente somos, quando ignoramos nosso potencial, aí sim vem o vazio. Estamos então simplesmente ocos.
Todos nascemos sozinhos, não solitários. Solitários, nós que nos fazemos. E assim, não fazemos nada.
Fonte: Dramaturgo e poeta romano